Monalisa Toledo é
professora de musicalização e regente de corais do projeto Canto na Escola
desde o início de 2012. Nesta entrevista vamos descobrir a trajetória de uma
moça de apenas vinte anos que fez o caminho inverso de muitos artistas
capixabas: veio do Rio de Janeiro para estudar e trabalhar com música na cidade
de Vitória.
Monalisa Toledo: Eu
nasci em Poços de Caldas, mas na verdade nem conheci a cidade. O meu pai era
vendedor, trabalhava com representação. Em cada ano ele ficava em uma cidade
diferente: Belo Horizonte, Franca, São Paulo, Rio de Janeiro, vários lugares.
Mas os meus pais são cariocas mesmo, do Rio de Janeiro.
Blog ITC: E como é que
surgiu a música na sua vida?
MT: A música é muito
forte na minha família, o meu avô por parte de pai era maestro. A minha mãe toca
tuba e meu pai começou tocando bateria, mas é tenor, ele canta. Os dois se
conheceram na igreja através da música. Desde criança eu sempre cantei, me
apresentei na igreja com os corais fazendo solos. Até que, quando eu tinha doze
para treze anos, nós fomos para Campos (dos Goytacazes-RJ) e surgiu o projeto
da Ong Orquestrando a Vida.
Nota do Entrevistador: O Orquestrando
a Vida se apresenta com o subtítulo “El Sistema Brasileiro” porque foi
implantado há mais de quinze anos por professores de música e maestros do
badalado programa de educação musical da Venezuela, hoje tido como referência
para o mundo e que revelou, entre outros, o regente Gustavo Dudamel. O projeto
é vencedor do Prêmio CULTURA NOTA 10 e o Prêmio CULTURA DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO 2011.
Leia mais:
http://www.orquestrandoavida.org/o-projeto/historia/
MT: Então, no
Orquestrando a Vida, surgiu uma vaga para estudar instrumento de cordas e eu
queria estudar violino, porque era o único instrumento da família de cordas
friccionadas que eu conhecia. Mas aí o maestro me entrevistou e nessa conversa
eu descobri que o violoncelo além de ser um instrumento melódico, era também de
base, de segunda voz. E eu me imaginei logo tocando o violoncelo e cantando ao
mesmo tempo, já pensou que irado que seria?
Blog ITC: Eu não me
lembro de já ter visto alguém fazendo isso.
MT: Mas eu consegui
fazer, tenho até uma gravação disso, cantando a primeira voz e fazendo a
segunda no violoncelo. Mas aí o maestro foi explicando sobre o instrumento, eu
fui me interessando e resolvi fazer. Eu era grande pra minha idade, a forma da
mão combinava com um instrumento grande (Monalisa mede 1.72 cm, pouco mais de
dez centímetros acima da média das brasileiras estabelecida pelo IBGE). E então
estudo o violoncelo desde os treze anos.
Blog ITC: Antes de
entrar para esse projeto você estudava música como?
MT: Antes disso era na
igreja e no conservatório que eu fiz quatro anos, eu morava em Nova Iguaçú e
meu pai me levava todo dia naquela confusão do Rio de Janeiro, então não
consegui levar à frente, porque eu era pequena; tinha interesse, mas a
dificuldade era muito grande. Eu só fui estudar música mesmo em Campos. O
projeto era bom, era grande, atendia mais de dois mil jovens e crianças e esse
projeto existe até hoje.
Blog ITC: Esse projeto
enfrentou alguns problemas não foi, tinha patrocínio até do Eike Batista?
MT: Sim, tem o
patrocínio da EBX do Eike Batista, da Coca-cola e da violinista que hoje dá
nome a um grupo do projeto: Orquestra Jovem Mariucca Iacovino.
Outra N.E: O site da Revista “Isto é
Gente” traz uma reportagem sobre Mariucca nos seguintes termos: “A amiga do
maestro Villa-Lobos; após assinar documento pela paz ao lado de Cândido
Portinari e Pablo Picasso e ter o visto negado para entrar nos Estados Unidos,
ela pode figurar no Guiness Book como a violinista mais velha em atividade no
mundo (sua carreira começou em 1918!)”.
http://www.terra.com.br/istoegente/49/testemunha/index.htm
MT: Houve essa época
em que o projeto estava acabando e nós fomos para a rua do Projac. A nossa
intenção era chamar atenção da Ana Maria Braga e ela parou para ouvir, nós
tocamos Carinhoso e ela se emocionou. Isso tudo em pé, violoncelo, violino,
todo mundo cantando a capela, sem acompanhamento nem nada. Aí a Ana Maria Braga
falou: “vamos fazer uma entrevista com esse grupo agora”. E nesse dia a Miriam
Daulsberg da empresa Dell’Arte, que é filha da Mariuccia, ligou e conseguiu
patrocinadores que estão até hoje apoiando o projeto.
Blog do ITC: Sua
família nunca teve grandes condições financeiras não é?
MT: Sim, para eu
estudar música estava sempre em projetos, estudei em escola pública a partir do
ensino médio que foi quando surgiu o meu gosto por regência e canto coral. Eu
estava no primeiro ano do ensino médio e a diretora me viu cantar, eu sempre
cantava o hino nacional nas formaturas e essa diretora me chamou para fazer um
coro de adolescentes. Nós chegamos a ter uma média de setenta jovens, foram
quatro anos, era o Colégio Estadual Benta Pereira de Campos dos Goytacazes. Eu
saí de lá porque vim para Vitória.
Blog do ITC: Sim, e
como é que você veio parar na capital dos capixabas?
MT: Meu sonho sempre
foi fazer faculdade de música, mas em Campos não tem.
Blog do ITC: Seus pais
não tentaram te influenciar a estudar outra coisa nesse momento?
MT: O meu pai queria
que eu fosse petroleira, fazer química. Ele pagou a minha prova, eu estudei pra
fingir que tava tudo certo, passei no negócio, mas fiz só uma semana. Na
sexta-feira falei: eu vou embora daqui. Eu ia pras aulas de química com
partitura de casamento pra fazer arranjo, preparando concerto, porque eu já
dava aula pro naipe de violoncelos da orquestra de alunos iniciantes. Minha
cabeça estava toda na música. E eu provei para meus pais que a música vale a
pena, que pode dar um retorno maior quando a gente se esforça. Então eu me
preparei pelo Conservatório Brasileiro de Música e falei com meu pai: vou fazer
faculdade. Daí ele falou: “Não, mas você não pode, vai ficar longe, eu não
tenho condições porque é caro demais.” E eu falei que ia tentar uma faculdade
pública.
Blog do ITC: Porque
você não tentou no Rio?
MT: O músico vai muito
pelo professor, questão de didática, de ensino e o meu, Sanny Souza, marcou a
minha vida quando eu tinha onze anos de idade. Eu o conheci num festival de
cordas que teve em Campos, eu estava bem no início e o Sanny me deu muita
atenção, me colocou pra fazer o solo de uma música, marcou muito para mim.
Então eu quis vir para Vitória por causa do Sanny. Mas resolvi fazer
licenciatura ao invés de bacharelado, porque abrange toda a educação musical,
eu gosto de ensinar, acredito muito na musicalização e na regência coral, não
gosto só do violoncelo.
Além de violoncelista da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo há
mais de vinte anos, Sanny é professor de violoncelo da Faculdade de Música - FAMES
e regente do coro sinfônico da Instituição.
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Blog do ITC: Como é
que você ouviu falar do projeto Canto na Escola?
MT: Eu assisti a uma
apresentação em vídeo, quando eu cheguei aqui conheci alguns amigos na
faculdade, o Elias (Salvador), que já trabalhava no projeto e me disse que
estavam precisando de professor. Então entrei em contato com Alice e hoje faço
parte do projeto.
Monalisa Toledo com o Coral do Canto na Escola numa apresentação na Casa de Congo da Serra |
Blog do ITC: Qual o
resultado que você vê das aulas de música junto às crianças?
MT: Na sala de aula da
musicalização eu procuro não só ensinar música, mas passar pra eles a importância
da disciplina, da pontualidade: a hora de chegar, a hora de falar, a hora de
ouvir. Com isso eles ficam mais calmos, mais policiados e conscientes da
importância de aprender. Na época das provas a professora de matemática do
terceiro ano me procurou para agradecer e conversar sobre a aluna Ana Julia, que
é uma menina muito hiperativa, muito agitada e essa professora veio me falar da
melhora que ela teve nas notas em sala de aula, porque começou a aprender a
prestar atenção, saber que aquela era a hora de ouvir.
Blog do ITC: O que a Ana
Julia gosta de fazer na aula de música?
MT: Ela gosta de
cantar. É aluna nova, entrou esse ano na musicalização, tem nove anos. Ela
chegou cheia das manias, de brincadeiras, parece que ela não sabia onde ela
estava. E hoje, já em outubro, final do ano praticamente, eu posso dizer que
ela mudou muito. A avó dela conversava comigo direto, dizia que ia tirar a menina
do coral como castigo, porque não aguentava mais. E hoje ela é uma aluna muito
obediente, sabe a hora das coisas, leva o material pra sala de aula. E esse
comportamento aprendido na musicalização a Ana Julia passou a adotar nas outras
disciplinas da escola o que surpreendeu muita gente, tanto que a professora de
matemática veio me agradecer...É esse tipo de coisa que faz a gente ter certeza que seguiu no caminho certo.
Blog do ITC: Obrigado pela entrevista Monalisa.
Blog do ITC: Obrigado pela entrevista Monalisa.
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